quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Quase 1 ano...


Ensaiei tantas vezes o que dizer se algum dia acharem o assassino do meu amigo Eric. Mas quase 1 ano se passou e nem o laudo do IML está concluido, greve, troca de delegado, descaso, vazio, tristeza, indignação rondam ainda nossas vidas. Mentalmente, acredito, quero acreditar, tenho que acreditar, ouso acreditar que um dia poderei ficar frente a frente com este monstro e dizer:
"Sabe? Você não matou uma pessoa qualquer que estava em seu caminho por abrir um restaurante melhor, você não matou alguém que com seu carisma e criatividade estava fazendo e trabalhando em algo que lhe desse prazer, que lhe dissesse o caminho a seguir após 30 e poucos anos de rumo incerto, conquistas deixadas, sonhos incompletos. Você matou alguém que estava feliz e me fazia feliz. Você tirou de mim e do meu marido, uns 40 anos que ainda nos restariam de sua amizade, sua alegria, seu jeito singular de ser.
Eric, se chamava de "nosso querido Bob" por causa daquele filme que o cara é tão carente, mas tão carente, que viaja para as férias de seu terapeuta e por gostar tanto de sua companhia e faz da vida dele um inferno. Ele ria quando passava este filme na TV e dizia - Olha, parece tanto comigo, aqui com vocês - e ele dizia isso com seu jeito humilde e atrapalhado, provalemnete pensando na próxima peripécia que ele faria para nos agradar, mas que com certeza saíria torta, seja pescando peixinhos gostosos para a gente e deixando o anzol ao alcance dos meus cachorros, seja perdendo a havaiana amarela novinha que comprei para ele e que não durou 1 dia inteiro, seja indo ao ensaio de Maracatu da cidade e ter que fazer todos os tambores se silenciarem pois ele perdeu a meia para um vira-lata que resolveu se refugiar no meio da roda, ou seja contemplando o mar e levando mijo nas costas, com ele a vida era assim: intensa e muito mais feliz.
Cada sorriso deste último ano teve um cantinho de tristeza, cada olho vermelho que vi em meu marido disfarçado de gripe ou sono, cada apertinho que dá de cada conquista nossa, de cada coisa que lembramos dele e não tínhamos mais ele para compartilhar. As piadas que ele me ajudava a fazer sobre os outros amigos do meu marido, as músicas de Otto que se calaram, os sabores, as sonecas agarrado com PTK (que ele chamava de "Minha namorada"), as brincadeiras com os cachorros que ele chamava de "irmãos", a bagunça de seu quarto, o cinto segurando a calça como o lobo mau do Pica-pau... Tudo isso e tanto mais deixou um vazio.
Todo dia no silêncio me lembro dele e como não sei rezar, só peço que Deus nos conforte, nos faça ser maior, nos faça ser justos, nos faça voltar a acreditar em algo que se perdeu, algo ingênuo que não volta mais, algo que de tão grande e precioso, não há justiça que pague, não há choro que estravaze, não há gesto que devolva.
Hoje eu só agradeço, pois é o que me resta. Agradecer por tê-lo conhecido."

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Cabelo, cabeleira, cabeluda, descabelada...

Vamos combinar? Eu não aguento mais cabelos lisos. Tá na cara que a pessoa é sarará e fica lá presa, amarrada, envelopada no lisinho fake.
Sempre que vou no salão alguém me oferece uma progressiva, inteligente, mega blaster escova com chocolate, canela, mel, limão, ácido, íons, prótons, eletrons. Eu sorrio, agradeço e digo: "Sou crespa". Meu amigo querido Ju, me chama de crespa e achei lindo ser crespa, acho que vem de um quadro das terças insanas que a mulher era lisa, lisa, tão fake lisa que ele criou "a crespa", não lembro ao certo.
Ainda mais aqui pelo Nordeste onde somos o verdadeiro Brasil de missigenação mistura o negro, com o índio, com mestiços, cafusos, sararás crioulos e mesmo assim saímos lisas? Em que mundo?
Quando era criança, lembro das lisas, elas eram minhas amigas. As fivelinhas que escorriam, os rabos de cavalos perfeitos sem precisar de fivelinhas adicionais, as tranças lindas sem ficarem despontadas e eu sofria calada e conformada - Sou crespa.
Depois veio a adolescência sofrida para os crespos, onde a moda era um topete lindo, liso e no alto, e eu dava uma surra de escova, gel bozano e criava a minha versão inspirada em Picasso do topete e era feliz. A vida deixava sermos felizes com as nossas qualidades e defeitos. Só se operava na época orelha de abano, e olhe lá!
Aí o mundo endoidou, escova japonesa, 8 horas de salão, 3 meses de salário e a mágica acontecia, saía eu linda com meu visual lisa, querendo ser quem eu não era e jamais seria, não tive a infância fácil das lisas após as aulas de educação física, não tive a adolescência tranquila do tepete feliz, nunca pude dançar a noite inteira e me olhar no espelho no final dela, não, nunca pude. Se suava encrespava mais, se encrespasse mais eu virava puro cabelo, dificultando a paquera de papinho ao pé do ouvido: - Oi, você vem sempre aqui? virava - OOOOOOIIIII!, eu afastava meu cabelo da orelha para poder ouvir o resto da frase do corajoso que resolveu desbravar meus cabelos para papear. Não, a escova milagrosa não poderia apagar anos e anos de sofrimento e dor.
O destino me tirou da cidade grande, os crespos não tinham vez por lá e me trouxe para o mundo do mar e do sol, pensei ter achado o meu lugar, o lugar do mar nos cabelos, dos cachos formados pelo vento, dos cremes Neutrox sem preconceitos, o mundo seria belo se não fosse isso que em algum lugar se instalou, a dominância dos falsos lisos apontando seus dedos para os crespos e esquecendo suas origens, suas dores e seus sofrimentos de uma infância de fivelas e uma adolescência com danças moderadas.
Este post é para você, cabeleireiros, ex crespos, falsos lisos... E se mais algum cabeleireiro me "sugerir" uma progressiva, vou mandar ele fazer progressiva nos pelos do &^%$. E se eu ver mais alguma criança de 5 anos fazendo escova cheia de formol na cabeça eu vou denunciar a mãe da criança que vai fazer ela perder o melhor da vida que é: aprender a ser diferente

Cadê o meu sofá?


Sabe a expressão "Mais perdido que cachorro em dia de mudança"?
- Ué? - diz PTK, olhando pela sala.
- Cadê? - diz PTK olhando na cozinha.
- Xiiii! - diz PTK olhando o banheiro.
- Será? - diz PTK entrando no quarto pela milésima vez.
- Ei, gente, esqueceram de trazer o meu sofá? Ei! Acordem! Cadê o meu sofá?

Cena narrada pelo meu marido e por mim, já na cama, exaustos da mudança, ouvindo os passos da nossa querida PTK, vira-lata da família do Scooby Doo, na primeira noite na casa nova, onde não foi avisada que o sofá antigo (cama extra oficial dela) iria para o lixo.

sábado, 3 de novembro de 2012

Matemática com amor

Várias vezes tentei entender o relacionamento dos meus pais. Parecia ser um casal que não combinava em nada. Minha mãe, leonina, exuberante no alto do seu "metro e meio", mandona, bem mais pé no chão que ele e debochada. Meu pai, um sonhador. Até que num flash do passado, entendi tudo.
Relembrei aos poucos de inúmeras cenas em que eles se uniam. Talvez eles nunca tenham reparado nisso, mas a matemática unia os dois, a paixão por números, por desafiar cálculos e problemas de lógica. Uma Professora de matemática casada com um Engenheiro de minas.
Minha mãe dava aulas particulares e às vezes se perdia ou esquecia alguma matéria e recorria a ele, que retribuia pedindo ajuda em algum cálculo que ele precisasse fazer para suas implosões. Forravam a mesa de vidro com a toalha branca. Meu pai com sua lapiseira bege 0,7 e o bloco impecável de quadriculados bem fininhos e azuis; e minha mãe com um lápis cotoco e uma borracha na ponta meio carcomida e uma folha avulsa toda bagunçada, logo ela, tão organizada sempre, mas quando o assunto era desafio era improvisado mesmo.
Não existia internet para se consultar as fórmulas, era de livro em livro, apostilas velhas e durava o tempo que teria que durar, podia durar horas, dias, mas o problema seria solucionado. Que lembrança gostosa. Acho que gosto de matemática por isso. Acho que estes momentos me mostravam que matemática era amor, paixão, não somente números vazios.
E acho que cada relacionamento tem que ter isso, este fio que une e que sustenta toda a chatice da rotina da vida a dois. Basta descobri-lo. Seja ele encontrado na matemática ou não.