La, la, li, la, rá... Aniversário da minha mãe. Fomos para Conservatória. Cidadezinha no interior do Rio de Janeiro, que vive da seresta. Pitoresca. Idade média dos habitantes: 80. Apenas 1 farmácia. Os velhinhos cantam. Muito. O tempo todo. O que me fez concluir que: Quem canta seus males espanta.
La, la, li, la, rá... Chegamos em Conservatória a tempo de ver a seresta de sexta-feira. Que alegria. Quantas cabeças brancas felizes, la, la, li, la, rá... Músicas de 1920, algumas de 1880, as mais modernas eram de 1950. La, la, li, la, rá...
Fomos para lá, pois soubemos que nos anos 80, uma das casas da cidade foi batizada com o nome do meu avô, homenageando uma música dele que era tocada nas serestas. Música até então nunca ouvida por nós da nova geração. Geração pós boêmia. Única música dele que sobreviveu ao tempo. La, la, li, la, rá...
Acho que para viver em Conservatória você passa por um processo de audição e apresenta algum dote artístico. O dono da pousada, cantava. A esposa dele, declamava poesias. O garçom, tocava violão. Me imaginei no filme Cocoon encenado na Broadway.
Chegou sábado e com ele o aniversário da minha mãe, e logo no café da manhã, mais la, la, li, la, rá... Fomos conhecer a cidade. E achamos a tal casa batizada de "Volta" de Mario Lopes de Castro. Muitas fotos depois... A noite chegou e com ela o momento auge da viagem. O museu da Seresta, sim lá tem um museu, os seresteiros cantando "Volta" para a minha mãe. Todos se viraram só para ela. A seresta sai pela cidade. Debaixo de chuva. De novo "Volta" é cantada com todos os olhares para a minha mãe, que já não sabia aonde se esconder.
No café da manhã do dia seguinte, mais la, la, li, la, rá, e "Volta" cantada em outra versão. Fomos para a periferia, pois descobrimos que uma das casas longe do centro urbano também tinha escolhido a música de meu avô para batizar sua residência, desta vez, quem escoheu a música foram 3 irmãos de 8 a 12 anos. E lá, eles cantaram para a gente a música, novamente. Lindas crianças que conseguiram cantar uma música que a própria família do autor desconhecia. Durante 48 horas minha mãe foi celebridade, pagando muitos micos, mas numa linda homenagem ao pai dela que morreu em 1945 e ela mal o conheceu. O dia dos pais passou, com um vazio imenso, para mim, pois sempre falta alguma coisa, mas por outro lado fiquei feliz em ver que existem coisas, pessoas, sentimentos e canções que são eternas. La, la, li, la, rá...
PS. No caminho de volta desligamos o rádio, não colocamos CD. O silêncio se torna importante depois de tanta cantoria. La, la, li, la, rá...