quinta-feira, 14 de maio de 2009

Diálogo desperdiçado

40 minutos de trânsito na Berrini, no carro atrás do meu, um pai e uma filha, nenhuma boca se mexeu, por muitos, muitos minutos. A filha, uns 30 e tralalá e o pai, cabelos brancos.
Cada vez que eu olhava pelo retrovisor, me dava uma agonia, uma dor e uma saudade. Com meu pai era impossível desperdiçar um diálogo, ele nunca deixaria. O silêncio não fazia parte da sua vida. Se estava sem assunto, ele inventava uma mentirinha, se nada vinha à cabeça ele contava algo repetido, ou elogiava a obra da Ponte Estaiada ou falava sobre a casa de passarinho de vidro que ele queria montar para ver os passarinhos nascerem.
Olho de novo e atrás de mim, nada de conversa, ou olhares, ou risadas, minha vontade era levantar do meu carro, bater no vidro deles e dizer: “Pelo amor de Deus, conversem! Qualquer coisa vale, mas conversem”.
Quando meu pai usava verde, eu o chamva de “Grilo Falante”. Como ele falava… Acho até que por uma certa carência, pois os momentos que estávamos juntos ele tinha que contar uma semana inteira de histórias que ele inventou ou dos trabalhos que fez. Era muito assunto para colocar em dia.
Mas, naquele dia, quis ser aquela menina do carro, desperdiçando aquele diálogo, pois pelo menos eu teria ele por perto. Mudei de pista, não aguentava mais ver aquela cena e aquele diálogo não acontecendo. Odiei aquela filha. Aumentei o som, estava tocando a música dele, cantei bem alto. Neste último ano, minha vida ficou silenciosa demais. 1 ano de saudades.

“Mas que nada
Sai da minha frente
Eu quero passar
Pois o samba está animado
O que eu quero é sambar
Esse samba
Que é misto de maracatu
É samba de preto velho
Samba de preto tú

Mas que nada
Um samba como este tão legal
Você não vai querer
Que eu chegue no final

O ariá raió
Obá obá obá”

Ah! O final da música ele repetia 80 mil vezes…

11 comentários:

Any disse...

Verdade...hoje em dia as pessoas desperdiçam a chance de simplesmente conversas...sem compromissos, agendas ou problemas a resolver...o conversar por conversar. Não tive isso com meu pai, mas tenho até hoje com minha mãe, nossos assuntos nunca terminam e tudo que podemos dizer uma a outra o fazemos. Uma outra analogia a esta realidade que vc presenciou e analisou...e a falta de luz, explico: já percebeu naquelas familias que nunca conversam pq estão sempre na frente da TV, quando falta luz, um olha para o outro e diz: e agora não temos nada para fazer....ORAS...como assim?? pq não preencher este tempo com uma boa conversa...já presenciei isso na minha familia e quando eu propus ahhhh, então vamos acender umas velas e conversar...alguém respodenu..conversar o que?? está com algum problema???....enfim um deseperdicio. Aproveito para te convidar a visitar meu blog...achei o seu no de uma amiga minha Lets. o MEU É http://redescobertasedescobertas.blogspot.com/
ABRAÇOS....

Simone disse...

Meus olhos encheram de lagrimas... meu pai adora camisa xadrez, e toda vez que ele poe uma eu pergunto se vai ter festa junina, ele se mata de rir, e eu também. Momentos valiosissimos e as vezes nao damos valor.

MH disse...

Meu pai não é falante, é mais fechado... mas NUNCA ficamos só os dois no carro no trânsito em silêncio, imagina! A gente fala da vida, de política, de futebol, de viagens, de tudo e mais um pouco... Ele só não fala direito mesmo é no telefone, aí é monossilábico. Mas tudo bem. Você me lembra do quanto é importante valorizar a presença! Dele e de todo mundo, porque ninguém está aqui para sempre...
beijo querida, adorei o post!

Renatinha disse...

Any,
Obrigada pela visita, pelo comentário e irei te visitar sim...
beijos

Simone,
Que delícia... Aproveite! Muito...
Não desperdice, tá?
beijo

MH,
Muito bom saber que este post serviu para lembrar que cada conversa pode ser a última... Valoriza-la é muito importante...
beijos e obrigada pelo carinho deste ano e dos demais
Re

Flávia D. disse...

Na verdade não se deve desperdiçar os momentos com ninguém, a gente nunca sabe o dia de amanhã. Você aproveitou todos, sinta-se feliz por isso.
bjos e bom fim de semana!

Paula Nigro disse...

Preciso dizer que rolaram algumas lágrimas do meu olho?
Puxa! Imagino a saudade...
Beijos

Denise Egito disse...

Puxa, que cena realmente triste. Também não consigo ficar em silêncio quando estou com meu filho. Graças a Deus, temos sempre assunto. Mesmo que eu bóie sobre os assuntos dele de vez em quando, como por exemplo, o tema escudos e captadores de guitarra. Como? =)
Um beijo, Rê e bom finde!

Roberto Ney disse...

Dizem que duas pessoas realmente se amam, quando nem o silencio incomoda... às vezes é bom cada um com suas divagações, mas só de vez em quando. afinal, nada como um bom papo...
passei aqui para deixar o endereço do meu novo blog, ok!
http://biografiashorizontais.blogspot.com/
grande abraço!

drika disse...

eu entendo o q vc sente, mas sou essa moça do carro.
ñ consigo ter um diálogo com meu pai. ñ por minha causa, por ele. ele ñ sabe falar, só criticar. ñ sabe dizer, só gritar. e aí, prefiro ficar calada.
às vezes, ñ é um desperdício de diálogo, é uma tentativa de ñ destruir um relacionamento ainda mais.
beijo, fica bem!

Adri disse...

É, além de ter o mesmo nome da Drika aí de cima, também concordo com ela. Nem sempre são os filhos que não querem conversar. Ou são eles que evitam mais uma discussão ou crítica. Ou vice versa também, pois também concordo com você Re que tem muito filho que despreza os pais e acham suas histórias caretas ou bobas e as deles, como filhos, mais interessantes.
Mas seja quem for o "culpado", é sim um grande irreversível desperdício. bjs

Dedinhos Nervosos disse...

Rê, eu tô aqui com os olhos cheios d'água... tô lembrando do meu avô, um homem maravilhoso, mas que nunca foi de grandes conversas. Ele era muito introspectivo e acabava ficando sempre na dele. Então, a gente acaba reagindo assim tb. Mas com a minha mãe e avó, é mto diferente. Temos assunto pra dar e pra vender, até mesmo quando assistimos juntas a novela. Delícia, né? Mas as coisas são assim mesmo. Com algumas pessoas, temos assuntos, com outras, não. Beijos e força.